Um último adeus

Quando eu estava no colegial, alguns amigos meus e eu frequentemente cabulávamos aula. Joana, Betão e eu éramos muito unidos. A Joana começou a namorar o irmão mais velho do Betão e cerca de um ano depois, eles tiveram um filho, o Pedrinho. Enquanto a Joana e eu crescíamos e deixávamos para trás os dias de cabular aula e beber até cair duras, entrávamos para a faculdade e planejávamos o nosso futuro, o Betão seguia o caminho contrário e parecia se afundar cada vez mais no mundo do abuso das drogas. Nós duas passamos a ver ele cada vez menos, mas as vezes eu esbarrava com ele e falávamos sobre o Pedrinho. Nós ríamos sobre as coisas que ensinaríamos para ele, sobre as histórias que contaríamos para ele, e estava muito claro que o Betão amava muito o sobrinho dele mais do que qualquer outra coisa. O jeito que os olhos dele brilhavam quando falávamos do Pedrinho falava tudo.

O Pedrinho já estava com um pouco mais de um ano de idade quando o Betão subitamente morreu, ainda muito jovem. O Pedrinho ainda era muito novo para tentarmos explicar porque o amado tio dele tinha ido embora para sempre, então ninguém falou nada o dia inteiro. Nós até evitamos falar sobre isso na frente do Pedrinho, porque ele tinha o hábito de imitar tudo o que ele via e repetia tudo o que ouvia, e não queríamos que ele ficasse falando sobre a morte do tio.

Na noite em que o Betão morreu, a Joana estava dormindo na cama com o Pedrinho para se confortar. No meio da noite, a Joana acordou porque o Pedrinho estava falando dormindo. Normalmente ele não fala enquanto dorme. Tinha um abajur ligado e ela podia ver o rosto angelical do seu filho, dormindo e sorrindo. "Oi Beto" ele falou claramente, e levantou a cabeça abrindo os olhos. Depois de alguns segundos de silêncio, o sorriso desmanchando aos poucos, ele falou "ta... tchau tio Beto" deitou a cabeça e dormiu de novo.

Ela me contou isso no dia seguinte, e apesar da parte lógica do meu cérebro tentar me dizer que o Pedrinho tinha ouvido alguém falar sobre o Betão e estava apenas repetindo aquilo, o meu coração me falava o contrário. Eu sei que o Betão encontrou alguma forma de explicar para o seu amado sobrinho que ele não ia mais ver ele, mas que ele o amava e estaria cuidando dele.


Sarinha - RJ - Rio de Janeiro