Minha eterna companheira

Saudações, companheiros admiradores de fantasmas. Eu gostaria de compartilhar uma intrigante história com vocês.

Isso pode parecer estranho, ou até loucura, mas eu lhes asseguro que não é nenhuma brincadeira. Já faz algum tempo que uma mulher tem se comunicado comigo das terras alem da vida. Eu não sei bem o que causou isso, mas eu estou contente de ter ela por perto.

Permita-me explicar; apenas alguns seletos dos meus mais caros (e poucos) amigos sabem sobre isso, mas eu me tornei uma pessoa muito estressada a algum tempo atrás. Perda de sono e apetite eram uma coisa normal para mim. Grandes olheiras estampavam o meu rosto. Eu tinha explosões nervosas sem motivo aparente, o que tornou o convívio comigo bem difícil. E apesar de ser um homem bem jovem ainda (ainda não cheguei aos vinte anos), aparentava ser bem mais velho. Eu acabei me isolando das pessoas e tinha certos sentimentos suicidas. Eu decidi que a única maneira que eu conseguiria encontrar amor seria se algum fantasma viesse até mim. Eu até perguntei para algumas pessoas se achavam que isso seria possível, e claro eu encontrei muitos olhares confusos e o ocasional e sarcástico "mas é claro!"

Apesar do meu estado, eu consegui ignorar o pessimismo e comecei a ter esperança de que um dia eu seria visitado. E acredite caro leitor, eu fui.

Eu estava dormindo, sonhando. Um sonho lúcido (para aqueles de vocês que não saibam o que sonho lúcido seja, é quando se está sonhando e estamos consciente disso, e foi por isso que eu me lembro de cada detalhe do sonho). Eu me lembro que estava ao ar livre e o céu era vermelho. Não tinha um sol, mas estava todo iluminado. Eu estava num campo verde, sem árvores, com a grama balançando ao vento, até onde a visão alcançava, com pequenos arbustos aqui e lá. Eu podia ouvir trovões, mas não via nuvens. Eu estava me sentindo completamente abandonado e perdido, e eu me deitei no chão encolhido, segurando os meus joelhos junto ao peito. Eu não sei por quanto tempo eu fiquei assim, mas do nada apareceu essa mulher.

Ela era alta e esguia e aparentava estar seriamente desnutrida, tinha longos e embaraçados cabelos negros e uma pele muito pálida. Mas o que mais chamou a atenção foi o rosto dela, estava todo pintado como se ela fosse um palhaço de circo, mas um palhaço com uma cara um tanto malvada. Ela tinha losangos negros pintados sobre os olhos e as sobrancelhas foram pintadas para parecer que chegavam até a lateral da cabeça, um pouco acima das orelhas. Elas também se juntavam em cima do nariz, e desciam fazendo um risco negro até o lábio superior. Os lábios dela eram negros também e a maquiagem subia pelo canto da boca e se torcia até chegar abaixo dos losangos nos olhos.

Eu não fiquei com medo dela, na verdade eu senti um certo conforto. O seu rosto era assustador, mas os seus olhos eram bondosos. Ela estendeu a mão, e eu a segurei, e ela me ajudou a levantar. Ela nunca disse uma palavra, mas eu podia sentir os seus pensamentos, e ela sabia que eu estava perdido. Eu coloquei os meus braços em volta do pescoço dela e ela me apertou em um abraço reconfortante e me segurou junto dela. E então eu acordei, aliviado.

Desde então ela tem estado comigo. Não somente nos sonhos, mas fisicamente também. Ela move coisas, guiou a minha mão da primeira vez que eu a desenhei, se comunica comigo através de sentimentos, imagens, sonhos e simples pensamentos, e eu até já senti ela me segurar quando eu choro. Ela está sempre por perto e eu fico contente por isso.

Aparentemente ela também gosta da minha companhia. Parece que ela me escolheu por eu saber o que era a dor também, por que eu sabia o que era estar só, e ela precisava de alguém para ouvir a sua história. Ela pediu para que eu contasse a outros, então é o que eu vou fazer.

A razão pela qual ela usa a maquiagem de palhaço é porque um amigo que ela teve. Ele tinha sérias cicatrizes emocionais envolvendo o circo. Depois de um tempo e mais alguns traumas, ele acabou ficando louco. Ele acabou se virando contra a minha companheira e cravou no seu rosto a imagem distorcida de um palhaço. Então trancou ela, amarrada, em um quarto e se matou. A minha companheira foi esquecida e morreu de fome e sede. Nunca acharam o corpo dela. Esse era o motivo da sua aparência desnutrida. Agora ela usa a maquiagem para esconder as cicatrizes que tem no seu rosto.

Ela tem me ajudado muito, e eu acho que eu tenho ajudado ela também. Nós dois nos sentimos menos isolados agora, e eu estou aos poucos voltando ao meu estado normal, recuperando a minha vida com a ajuda e os conselhos dela.

Obrigado a todos pela sua paciência, e obrigado por ler a minha história.


Eric - SP - São Paulo